[Suplemento] Europeias: como querem os partidos portugueses combater a desinformação?
Estive a ler os programas dos partidos, à procura de referências explícitas ao tema da desinformação. Domingo há eleições em Portugal.
🖊️Bloco de Notas | Como tem dito e repetido o
, na , estas europeias (que em toda a UE devem acontecer entre 6 e 9 de junho) são fundamentais para o futuro imediato (e talvez além disso) do projeto europeu (já agora, também vale a pena espreitar o , do ). Antecipa-se um crescimento exponencial da representação da extrema-direita no PE, o que necessariamente influenciará o rumo da União.Ao longo dos últimos anos, de forma muito particular desde a pandemia - mas não apenas devido à covid-19 - a desinformação tem estado na agenda de Conselho, Comissão e Parlamento europeus. Esta abala a confiança nas instituições, compromete a coesão social e coloca em causa os processos democráticos. O caos favorece a ascensão de discursos populistas e extremistas perigosos.
🔎Desinformação nos programas eleitorais
De que forma a desinformação é, então, tratada nos programas/manifestos eleitorais de AD, PS, Chega, IL, BE, CDU, Livre e PAN? O que propõem - em concreto - os principais partidos portugueses sobre o tema?
Bem, alguns não propõem nada. Nos programas/manifestos de Chega, Iniciativa Liberal, CDU e PAN não encontrei qualquer referência direta à desinformação. Nalguns casos, são feitas menções ao acesso à informação, liberdade de expressão ou opinião, mas o objetivo era identificar propostas concretas para um problema concreto.
Aliança Democrática
O programa eleitoral da AD faz três breves e vagas alusões à desinformação. A coligação promete: i) Proteger a democracia e promover um forte combate à desinformação; ii) Reforçar a resiliência dos cidadãos contra a desinformação e a propaganda estrangeira; e iii) Responsabilizar as Plataformas das Redes Sociais na luta contra a desinformação;
📚Ler mais/Fonte: Programa AD
Partido Socialista
O PS também decidiu não perder muito tempo com a desinformação. Quer: i) Promover os valores democráticos e defender as democracias europeias de tentativas de influência externa, criando instrumentos que evitem a manipulação de atos eleitorais ou a difusão de desinformação; ii) Acompanhar atentamente a atividade das grandes plataformas digitais, evitando abusos de posição dominante, combatendo a desinformação e sancionando a propagação de conteúdos ilegais.
📚Ler mais/Fonte: Programa PS
Bloco de Esquerda
O manifesto eleitoral do Bloco de Esquerda não usa a palavra desinformação, preferindo a expressão fake news. O partido promete: i) Reforçar os recursos e a cooperação europeia para combater as fake news, promover o jornalismo e salvaguardar direitos fundamentais sobre o conteúdo ilegal em plataformas privadas, em particular no combate à violência sexual contra crianças; ii) Impor a transparência algorítmica e reforçar os direitos de trabalhadores de plataformas digitais.
📚Ler mais/Fonte: Manifesto Europeias
Livre
O Livre é o partido que mais espaço dedica à desinformação no seu programa e o único com propostas mais ou menos efetivas - e não apenas intenções genéricas. A força política assume que “a desinformação tem sido uma das principais ferramentas de ameaça à democracia” e propõe: i) A criação de reguladores com recursos suficientes que permitam uma moderação viável e eficaz em grande escala; ii) O reforço dos recursos do Observatório Europeu dos Meios de Comunicação Digitais (EDMO); iii) A garantia que as regras e regulamentos estabelecidos no Regulamento dos Serviços Digitais (Digital Services Act) são implementados e cumpridos de forma eficaz, com um incentivo ao seu alargamento a mais plataformas online e motores de busca; iv) Uma maior divulgação dos dados estatísticos do Eurostat, para que os factos possam chegar a mais pessoas.
📚Ler mais/Fonte: Programa Livre
Os programas/manifestos dos outros partidos: Chega; IL; CDU; PAN
🔎A UE perante a desinformação
Desde 2015 que a desinformação está na agenda da UE. Em 2018, foi publicado o primeiro (a nível mundial) Código de Conduta sobre Desinformação.
Em 2022, a partir de um novo conjunto orientações da Comissão Europeia (2021), das lições aprendidas com pandemia e guerra na Ucrânia, foi publicado, um novo Código de Conduta.
Em resumo, o Código de 2022 procura:
Alargar a participação, dirigindo-se a um conjunto alargado de intervenientes;
Eliminar os incentivos financeiros à propagação da desinformação;
Identificar comportamentos manipuladores como contas falsas, bots, etc;
Capacitar os utilizadores;
Promover a verificação de factos;
Assegurar a transparência da propaganda política;
Facilitar o acesso a dados das plataformas, por parte de investigadores;
Criar um Centro para a Transparência e um Grupo de Trabalho.
Veja no Eurocid a cronologia das principais iniciativas da UE contra a desinformação.
🔎A desinformação nestas eleições
A desinformação não é apenas um tema na agenda: é uma ameaça real. Ao longo dos últimos meses, União Europeia e Estados membros têm lutado contra campanhas de desinformação que comprometem o debate de ideias e as perceções sobre os assuntos em pauta.
O olhos viram-se para a Rússia e para iniciativas de Moscovo, incluindo o recurso a deepfakes e doppelgängers (ver abaixo).
Na Polónia, uma comissão encarregada de investigar a influência russa e bielorrussa iniciou funções esta quarta-feira, anunciou o primeiro-ministro polaco Donald Tusk. Na Bélgica, o Comando Cibernético está em alerta elevado.
É hoje amplamente aceite que países terceiros terão manipulado o espaço online em eleições anteriores na Europa e noutras regiões, incluindo as presidenciais norte-americanas de 2016, que deram a vitória a Trump. Nas atuais campanhas, os temas mais recorrentes parecem ser a guerra na Ucrânia, o conflito no Médio Oriente a crise climática e as migrações.
Quarta-feira, um comunicado conjunto das instituições europeias sintetizou o problema e a forma como está a ser abordado. Eis o essencial:
As eleições europeias são um emblema da democracia europeia. Os intervenientes da desinformação, dentro e fora da UE procuram comprometer a integridade do processo eleitoral, a confiança nos processos democráticos em geral e semear a divisão e polarização nas sociedades.
De acordo com o Eurobarómetro, 81 % dos cidadãos da UE concordam que as notícias ou informações que deturpam a realidade ou são falsas constituem um problema para a democracia.
Os atores da desinformação difundiram informações falsas sobre como votar, desencorajaram os cidadãos de participar nas eleições ou procuraram dividir e polarizar os eleitores antes da votação.
Os principais líderes políticos são frequentemente alvo de campanhas de manipulação da informação. Várias políticas europeias também são alvo constante da desinformação.
Os agentes da desinformação também recorreram a redes de contas falsas e a meios de comunicação social falsos.
Recentemente, um relatório da empresa de software finlandesa Check First, desvendou o nível de coordenação e de sofisticação da chamada "Operation Overload". Contas suspeitas contactaram mais de 800 verificadores de factos e meios de comunicação em mais de 75 países, de modo a sobrecarregá-los com informações falsas, esgotar os seus recursos e convencê-los a propagar informações falsas.
📚Fontes/Ler mais:
[RFI] Na era das fake news, União Europeia tenta salvar as urnas dos riscos da desinformação nas eleições
[Público] Como a Rússia usou os partidos populistas para espalhar desinformação na Europa
[RTP] "Deepfakes" e "doppelgangers". Como a Rússia estará a interferir nas eleições europeias
[EuroNews] Países da UE reforçam esforços anti-desinformação antes das eleições europeias
[Parlamento Europeu] Eleições europeias 2024: Instituições da UE estão preparadas para combater a desinformação
[Parlamento Europeu] Foreign interference around elections - Parliament’s investigations, warnings and measures
ℹ️ Deepfake
Deepfake refere-se ao uso de inteligência artificial para criar vídeos, áudios ou imagens falsos, mas extremamente realistas. São conteúdos digitais com alta probabilidade de enganarem os espectadores.
ℹ️ Doppelgänger
Doppelgänger refere-se à criação de contas falsas que imitam pessoas reais, com o objetivo de enganar e manipular. Essas contas são usadas para espalhar informações erradas e influenciar a formação de opiniões.
📺Dicas para evitar desinformação
Também lhe pode interessar:
A série de vídeos do Parlamento Europeu sobre as técnicas utilizadas pelos agentes de desinformação.
O folheto do Parlamento Europeu com 10 sugestões sobre como combater a desinformação;
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